quarta-feira, 15 de abril de 2015

Considerações acerca das Altas Habilidades

Todo aluno tem ritmos e estratégias diferentes no que diz respeito à aprendizagem. Esse pressuposto, que já foi bem explorado nos estudos sobre heterogeneidade (BREMMER, 2008; MENEZES, 2011), nos leva a buscar explicações e alternativas para outro tema, também bastante estudado, as altas habilidades.
Os debates em torno da educação de pessoas com altas habilidades têm ganhado mais atenção nos últimos anos. Legislações educacionais estão cada vez mais cobrindo o que por meados dos anos 90 era tido como dificuldades, alunos com altas habilidades se encaixavam nesse termo. Infelizmente, o processo de inclusão está preso apenas à lei. As escolas, pelo menos a maioria delas, não têm cumprido seu papel de inclusão em relação a esses alunos, mesmo com várias orientações do MEC, o que dificulta o ensino desses jovens.
A escola, apesar de não cumprir seu papel de desenvolver o potencial dos alunos com altas habilidades, não pode arcar com toda a responsabilidade. Esses alunos, como qualquer outro ser humano, possuem outros círculos de convivência e influência. O que eu quero ressaltar no post é a importância da família, como núcleo social, no desenvolvimento cognitivo de crianças com altas habilidades. 
Antes de tudo, vale observar que várias terminologias se aplicam, quando se fala em altas habilidades. Segundo Alencar e Feldhusen e French (2004), enquanto alguns pesquisadores utilizam os termos altas habilidades e superdotação como sinônimos, outros estudiosos estabelecem diferenças entre eles. Aqui vocês podem perceber que as terminologias 'altas habilidades' e 'superdotação' também serão tomadas como sinônimas.
Indivíduos que possuem facilidade em determinadas áreas de interesse com rapidez de aprendizagem são considerados educandos com altas habilidades, segundo as Diretrizes Nacionais da Educação Especial para a Educação Básica (BRASIL, 2001, art. 5º, III). E por mais que este aluno tenha essa facilidade e rapidez de que falei, isso não significa que seu desenvolvimento cognitivo não necessite da ajuda da família ou escola. Observo que o papel da família é primordial, tendo em vista as diversas áreas que uma criança com altas habilidades pode se envolver.
As altas habilidades/superdotação são definidas oficialmente como sendo: Alunos com altas habilidades/superdotação demonstram potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes, além de apresentar grande criatividade, envolvimento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse (BRASIL, 2008, p. 9).
Há uma deficiência de formação de profissionais no Brasil para atuar com esses educandos e seus responsáveis. Também, há falta de programas públicos que atendam a crianças dotadas de altas habilidades. 
Destaco aqui, além disso, o estudo sobre a superdotação feito por Renzulli (1986), no qual o autor defende que deve haver uma mudança no enfoque das definições de superdotação, de ser ou não ser superdotado, para desenvolver comportamentos superdotados, e afirma também que tais comportamentos “estão presentes em algumas pessoas, em determinados momentos e sob determinadas circunstâncias” (p. 76). Renzulli elaborou o Modelo dos Três Anéis, no qual a realização superior de um indivíduo em uma área de conhecimento acontece devido a um conjunto de três dimensões em interação: habilidade acima da média (não necessariamente superior), criatividade e envolvimento com a tarefa. 
A habilidade acima da média é definida em termos de habilidade geral e habilidades específicas. Renzulli afirma que a “habilidade geral consiste na capacidade de processar informação, integrar experiências que resultam em respostas apropriadas e adaptativas a novas situações, e na capacidade de se engajar em pensamento abstrato” (p. 66). Quanto à habilidade específica, “consiste na capacidade de adquirir conhecimento, habilidades, ou à habilidade de desempenho em uma ou umas atividades de um tipo especializado e dentro de uma variação restrita” (p. 66). O envolvimento com a tarefa se refere à energia investida pelo indivíduo em uma tarefa específica ou em uma determinada área. Por fim, a criatividade consiste em: características do pensamento, como fluência, flexibilidade e originalidade, abertura a novas experiências e receptividade ao que constitui novidade no âmbito de pensamentos, ações, produtos próprios e de outras pessoas; sensibilidade, curiosidade e ousadia; e características da produção dos indivíduos superdotados, como inovação, riqueza de detalhes e abundância (Renzulli & Reis, 1997).
No estudo proposto por Renzulli, as três dimensões (habilidade acima da média, envolvimento com a tarefa e criatividade) devem ser consideradas como fruto da interação entre fatores ambientais e de personalidade (Renzulli, 2003, 2005). Ademais, nesta perspectiva, a superdotação não é um fenômeno visto como estático e fixo. Ao contrário, ela pode ser desenvolvida em certas pessoas, em determinados momentos e sob certas circunstâncias (RENZULLI, 1986).
Com isso percebemos a importância da família e também a importância de programas para auxiliar a família junto ao desenvolvimento cognitivo de uma criança dotada de altas habilidades. Mesmo que a família se transforme, como instituição social e histórica, ao longo dos anos, isso não é um ponto que atrapalhe o desenvolvimento, pois segundo Delou (2007), os pais são provedores, educadores e mentores, modelos intelectuais e sociais, disciplinadores, conselheiros, ouvintes e companheiros e, ainda atuam como promotores de interesses e orientadores vocacionais. 
É importante que o ambiente familiar seja propício ao melhor desenvolvimento cognitivo das crianças superdotadas. Se levarmos em consideração as concepções acerca de altas habilidades segundo as teorias abordadas, podemos propor um papel à família dessas crianças. Por ser o núcleo social com que a criança tem o seu primeiro contato, a família é ainda mais importante do que a escola para o desenvolvimento cognitivo nas fases mais tenras desse processo. Renzulli entende que o fator biológico – isto é, o conjunto de informações preestabelecidos pela genética – não é determinante único e exclusivo das altas habilidades. Este autor defende que é o contato com a história e a cultura de uma sociedade que aprimora as habilidades para as quais um indivíduo já tenha aptidão; e o estímulo ao desenvolvimento cognitivo parte da família.
É bom lembrar que a visão tradicional do que é família já deixou de ser utilizada nas pesquisas mais recentes sobre altas habilidades. A família constituída por pai, mãe e filhos, na sociedade atual, não é tão consolidada como há alguns anos atrás. Sendo assim, entende-se que é um posicionamento infeliz para o pesquisador generalizar este conceito. “Núcleo familiar” deve-se conceber como alguém que é responsável pela criança e convive com esta.

Obs.: Texto produzido em parceria com Ágda Santos, do Papel de Sêmica.

Referências

ALENCAR, E. M. L. S., Feldhusen, J. F., & French, B. (2004). Identificando talentos, aspirações profissionais e pessoas mais admiradas por estudantes. Psicologia Escolar e Educacional, 8(1), 11-16.BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, 2008. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/polit ica.pdf. Acesso em 03/07/2014DELOU, C. M. C. O papel da família no desenvolvimento de altas habilidades e talentos. In: ALENCAR, E.M. L. S., FLIETH, D.S. Desenvolvimento de talentos e altas habilidades. Porto Alegre: Artmed, 2007.Renzulli, J. S. (2005). The three-ring conception of giftedness: A developmental model for promoting creative productivity. Em R. J. Sternberg & J. E. Davidson (Orgs.), Conceptions of giftedness (pp. 246-279). New York: Cambridge University Press.____________, & Reis, S. M. (1997). The schoolwide enrichment model: A how-to guide for educational excellence. Mansfield Center, CT: Creative Learning Press

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